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A existência de crianças e jovens com necessidades educativas especiais perde-se, naturalmente, no tempo. Mas, a preocupação de encontrar respostas para cada uma destas situações é relativamente recente.
Portugal viveu, ao longo de muitas décadas, completamente afastado das preocupações sociais e educativas. Foi com a Revolução do 25 de Abril de 1974, que começaram a despontar na sociedade algumas respostas para os problemas existentes em diversas áreas.
Em vários concelhos do Distrito de Santarém, a coordenação da Acção Social, durante 26 anos, foi assumida pela Dra. Maria de Lourdes Goucha Jorge. A sua formação académica, Assistente Social, permitiu-lhe verificar que existia um grande grupo de crianças e jovens com deficiência. Mas, não existiam respostas nem para os jovens, nem para os pais.
Por isso, em Julho de 1976, a Dra. Maria de Lourdes Jorge decidiu estabelecer os primeiros contactos com o então Presidente da Câmara Municipal de Abrantes, Eng. José dos Santos de Jesus (Bioucas). O apelo era simples. Era urgente fazer alguma coisa em prol das crianças e jovens deficientes do concelho. A ideia foi bem recebida e, desde então, o Eng. Bioucas nunca mais deixou de ser, como autarca e como pessoa, um entusiasta da obra que se ia definindo.
Também alguns pais, a braços com este problema de filhos com dificuldades, mostraram entusiasmo pela ideia que estava a nascer do carinho, do amor e da boa vontade de todos pela criação de uma alternativa para acolher os seus filhos que não estavam enquadrados no sistema regular de ensino e aprendizagem.
O sonho ganhava forma. Multiplicavam-se os contactos.
Em Outubro, desse mesmo ano, na sequência de uma reunião alargada a toda a vereação da Câmara e onde já estiveram presentes outros interessados, nasceu a Comissão Instaladora da Associação. Após a eleição, a Comissão ficou constituída pelo Presidente da Câmara, dois professores, três pais, dois elementos da população, um médico e duas técnicas de serviço social. Seguiu-se a escolha da designação a atribuir à Associação: CRIA – Centro de Recuperação Infantil de Abrantes, reuniu a unanimidade.
Estava reunido o grupo de trabalho, os objectivos eram concretos e evidentes e o programa de acção estava traçado. Era necessário proceder à legalização da associação, procurar uma sede, estabelecer contactos com as entidades oficiais e particulares, bem como divulgar todo este projecto junto da população do concelho.
Foram elaborados os estatutos e, em 23 de Março de 1977, foi efectuada a escritura notarial. Assim, ganhou forma jurídica e legal “a associação sem fins lucrativos e de duração indeterminada, denominada CRIA – Centro de Recuperação Infantil de Abrantes, com sede provisória na Praça Barão da Batalha, nº 2 de polícia, freguesia de S. João Baptista, cidade de Abrantes, que tem por fim promover a motivação e adaptação da criança diminuída à família, à sociedade, através da sua educação e valorização profissional”.
Em Maio de 1977, D. Palmira Vieira Ferreira cedeu uma casa em Rio de Moinhos e 100 mil escudos para as necessárias obras de adaptação, para que naquele espaço se pudesse instalar o C.R.I.A.
Nesse mesmo ano, nas instalações de Rio de Moinhos, eram acolhidas as primeiras crianças. Inicialmente chegaram vinte e duas crianças, mas este número foi aumentando.
Nestes primeiros tempos, uma das grandes dificuldades do CRIA prendia-se com o transporte das crianças, até final de 1978/79 não houve transporte próprio e havia então que recorrer aos transportes públicos. Alguns pais de alunos, com carro próprio, estabeleceram um circuito de transporte de crianças, contando também com a preciosa colaboração de um serviço de transporte de militares e da carrinha das Iniciativas Culturais da Metalúrgica Duarte Ferreira.
No final de 1979, a EPER – Entraide des Églises Protestantes Suisses, fazia a oferta de duas carrinhas de 15 lugares. A primeira chegaria ainda em 1979, a segunda já em 1980.
Ficava assim resolvido o problema do transporte das crianças.
Inicialmente o corpo técnico era constituído por sete professores do 1º Ciclo do Ensino Básico, um professor de educação física, um psicólogo, um terapeuta da fala, dois vigilantes, uma cozinheira e um servente.
No final do ano lectivo de 1977/78 a Comissão Instaladora terminou o seu mandato e foram eleitos os primeiros Órgãos Sociais, nomeadamente Assembleia Geral, Direcção e Conselho Fiscal.
O trabalho continuava a decorrer com um enorme entusiasmo de todos. Mas, começavam a desenhar-se outras necessidades específicas, numa altura em que a área educacional estava assegurada. Era necessário criar respostas para as situações de pré-profissionalização e profissionalização dos jovens. Foi então que o CRIA beneficiou de um acordo Luso-Sueco, através do qual foi equipada uma primeira oficina.

O número de utentes foi aumentando e a casa de Rio de Moinhos começava a ser pequena face às necessidades. Novos espaços começaram então a surgir. A Câmara Municipal de Abrantes cedeu espaços no Convento de S. Domingos para a escolaridade e pré-profissionalização. A Santa Casa da Misericórdia de Abrantes cedeu várias dependências, que permitiram a realização do primeiro curso de formação profissional. Mais tarde, mudaram-se para uma casa de três pisos na rua D. Miguel de Almeida, em Abrantes cedida pelo Eng. José Manuel Bioucas, onde funcionaram os serviços administrativos, uma parte da formação profissional e alguns serviços auxiliares. Em 1994, nesta “Casinha” – como era carinhosamente chamada – começou a funcionar o CAO (Centro de Actividades Ocupacionais). Entretanto, numa outra casa, em Alferrarede, funcionava já uma parte da escolaridade e pré-profissionalização.
Houve um espaço de tempo em que o CRIA funcionou, simultaneamente, em cinco edifícios dispersos em vários locais. Por isso, crescia o sonho e a necessidade premente de possuir um espaço próprio, com condições adequadas e onde o trabalho conjunto pudesse ser uma realidade.
Em finais da década de 70, foi colocada a hipótese de compra de um terreno de 10 hectares, terra de pinheiros e oliveiras, em Olho de Boi, na freguesia de Alferrarede. A escritura de compra efectuou-se em 26 de Janeiro de 1984, tendo o CRIA pago 400 mil escudos por cinco hectares do terreno, os outros cinco hectares foram oferecidos pelo proprietário do terreno, Eng. Miguel Paes do Amaral.
Entretanto, entre sonhos, aquisições de terreno e uma mão cheia de projectos, era público o reconhecimento do trabalho desenvolvido.
Em 1982, o Centro de Recuperação Infantil de Abrantes foi reconhecido como Pessoa Colectiva de Utilidade Pública.
O terreno já existia e o projecto da obra nasceu, ambicioso e forte, mas fundamentalmente muito necessário. Era urgente a construção de instalações próprias e adequadas ao ensino e formação de crianças e jovens portadores de deficiência.

Um espaço capaz de responder, de modo eficiente, aos objectivos futuros que a Direcção do Centro de Recuperação Infantil de Abrantes, tinha sonhado para o desenvolvimento, a longo prazo, desta Instituição .
O sonho tinha formas claras e definidas, mas alcançar a sua realização afigurava-se difícil. Vários anos se passaram, enquanto se multiplicavam os contactos para angariar apoios para a realização de tão ambicioso projecto.
Já escrevia o Poeta que “O Homem Sonha e a Obra Nasce”. Foi assim no CRIA. O sonho ganhou forma e fez-se obra, fruto da persistência, do esforço e do suor de uma mão cheia de gente de coração grande.
No dia 20 de Setembro de 1991, era lançada a primeira pedra para a construção das novas instalações do Centro de Recuperação Infantil de Abrantes.

A obra foi ganhando forma, foi crescendo, os apoios foram chegando e o sonho era cada vez mais uma realidade.
O dia 14 de Junho de 1996 ficará para sempre na História da Instituição.
As novas instalações estavam prontas a inaugurar. Tratou-se de um investimento de grande envergadura que permitia sonhar mais alto e olhar longe.

Para simbolizar a importância da obra, as novas instalações foram inauguradas pelo então Primeiro-Ministro de Portugal, Eng. António Guterres, acompanhado de diversas entidades civis, militares e religiosas.

O momento foi de festa, principalmente no interior de todos aqueles que, de algum modo, tinham contribuído para que esta obra magnífica fosse possível. Mas, era também de uma imensa alegria para os pais e familiares das crianças e jovens com deficiência, que encontraram aqui as respostas que há tanto ambicionavam para os seus filhos.

Nas novas instalações, com excelentes condições de trabalho, foi possível desenvolver um trabalho ainda mais qualificado, levado a cabo por todos aqueles que, no seu dia-a-dia, dão o seu melhor junto dos utentes com o intuito de promover o seu desenvolvimento integral a nível educacional, social e profissional.

Neste mesmo ano de 1996, a Câmara Municipal de Abrantes atribuiu ao Centro de Recuperação Infantil de Abrantes a Medalha de Mérito Social do Município, o mais alto galardão atribuído por esta entidade, como reconhecimento do trabalho de intervenção que a Instituição vinha desenvolvendo junto da comunidade, desde 1977.

Com novas instalações desenhadas face às necessidades do trabalho foi possível alargar os objectivos, as terapias e o número de alunos. O Centro de Recuperação Infantil de Abrantes, passou a dispor de instalações e equipamentos adequados ao desenvolvimento das diversas valências que o constituem, assim como extensos espaços no exterior que possibilitam a realização de excelentes actividades ao ar livre.

O espaço cresceu e, com ele, todo o trabalho adquiriu uma dimensão diferente.
Novos sonhos voltaram a desenhar-se. Ganharam contornos e, a necessidade dos utentes, levaram a que ganhassem forma.
Os utentes cresciam e os meninos de ontem, são hoje homens e mulheres que atingiram a idade adulta. As famílias foram, naturalmente, envelhecendo e algumas começaram a registar perdas naturais, no ciclo da vida. A velhice diminui as forças e reduz substancialmente a capacidade de alguns pais continuarem a cuidar dos seus filhos, de modo especial, dos mais dependentes. Com o cansaço da vida e o peso da idade, foram muitas as famílias que começaram a fazer sentir aos responsáveis do CRIA as suas preocupações com o futuro dos seus filhos. “Quero morrer em paz e saber que o meu filho tem quem cuide dele”, este é um dos desabafos frequentes, vindo das famílias.
Surgiu assim o sonho e a necessidade de construir um Lar Residencial para os utentes, nomeadamente para os que possuem menor grau de autonomia.

A residência entrou em funcionamento, a partir de 1 de Julho de 2007.

Em 2009 o CRIA mudou de designação, de Centro de Recuperação Infantil de Abrantes passa a designar-se Centro de Recuperação e Integração de Abrantes, mantendo a sigla CRIA, mas adaptando-se assim à realidade das suas respostas sociais.

Em 2021, fruto de uma parceria com a Câmara Municipal de Mação, entram em funcionamento duas novas respostas sociais, um Lar Residencial e um CACI-Centro de Atividades e Capacitação para a Inclusão na Vila de Mação.

No futuro, certamente, novos sonhos nascerão e novas obras crescerão…